Face à recente notícia acerca do pleno funcionamento e da preservação dos serviços de
urgência em ginecologia e obstetrícia do Centro Hospitalar da Póvoa de Varzim/Vila do Conde
e do Centro Hospitalar Médio Ave [Famalicão], vem o Observatório de de Violência Obstétrica
em Portugal (OVO PT) destacar:
1. O OVO PT congratula a decisão de manter o funcionamento destas unidades;
2. O relatório/estudo técnico da Comissão de Acompanhamento da Resposta em Urgência
de Ginecologia, Obstetrícia e Bloco de Partos (doravante Comissão) até hoje não foi
tornado público e colocada a discussão pública;
3. A falta de informação sobre as decisões acerca dos outros 4 locais anteriormente
indicados pela Comissão: Guarda, Castelo Branco, Vila Franca de Xira e
Barreiro/Montijo;
4. A importância de que os Hospitais que sejam capital de distrito,como o são os hospitais
de Castelo Branco – funciona apenas com um médico no quadro – e o da Guarda,
devem sempre manter as suas funções, apostando na melhoria dos serviços e na
captação de médicos obstetras através de incentivos económicos. Ao mesmo tempo,
devem ser reorganizados os serviços conforme tem vindo a ser proposto pela Ordem
dos Enfermeiros, o que iria conferir mais autonomia aos Enfermeiros Especialistas,
libertando a pressão exercida nos médicos e garantido uma melhor qualidade no
atendimento por via da proximidade;
5. A necessidade de reflexão sobre a criação de centros de parto no Serviço Nacional
de Saúde (SNS), aditando-se a previsão destes centros aos Decreto-Lei 279/2009 de 6
de Outubro, facilitando o seu processo de licenciamento privado.
Apesar de em Portugal se praticar o modelo biomédico e tecnocrático, o médico obstetra não é
– nem deve ser – o único profissional de saúde que participa na vigilância da gravidez e na
assistência ao parto e ao pós-parto, assim como IVG, IMG, perda gestacional, processos de
fertilidade e quaisquer cenários acolhidos pela obstetrícia.
O OVO Portugal congratula as informações facultadas pelo Prof. Dr. Diogo Ayres de Campos –
prestadas na 9º Comissão de Saúde de 4 de Janeiro de 2023 – onde aponta a criação de uma
norma da Direcção Geral de Saúde (DGS). Nessa norma é apontado que sejam definidos os
papéis de cada profissional, e também o esclarecimento cabal do que é uma “gravidez de baixo
risco” e uma “gravidez de alto risco” de acordo com as recomendações da Organização
Mundial da Saúde, entre outras recomendações e orientações consonantes com o tão
desejado e necessário modelo biopsicossocial, que o OVO PT preconiza como essencial para
solucionar o problema das urgências e, tantos outros que surgem no panorama obstétrico
português.
É necessária a implementação de uma Rede de Referenciação Hospitalar de saúde
perinatal, saúde materna e infantil e seria interessante que o Grupo Técnico/Trabalho
convidasse ou integrasse representantes da população, tais como: associações que trabalham
questões relacionadas com a vida sexual e reprodutiva das mulheres, associações de
estudantes na área da saúde, sindicatos de medicina e enfermagem, movimentos cívicos pelos
direitos das mulheres e organizações não governamentais.
Entende também o OVO PT que devam existir regras iguais para os Serviços de Saúde
Públicos e para a saúde Privada, mas que o foco e prioridade seja sempre centrados nos
meios para fixação de profissionais no serviço Público (médicos, enfermeiros, entre outros),
implementando uma tabela nacional de reorganização dos respectivos horários semanais
conjuntamente com as horas de urgências, e ter em conta o que o Dr. Fernando Araújo, CEO
do SNS, disse em entrevista à TSF no dia 22/01/2023.
Relativamente ao Despacho 557/2023 que aprova o Regulamento do Programa de Incentivo
Financeiro à Qualificação dos Blocos de Parto do Serviço Nacional de Saúde, o que irá
permitir a requalificação de infraestruturas e equipamentos nos blocos de parto das unidades
de saúde do SNS, e que esta aprovação vem permitir um melhor nível de qualidade na
prestação de cuidados e também a compatibilização com as melhores tecnologias e práticas
clínicas, o OVO PT sugere que tenham em consideração a implementação das seguintes
melhorias:
– A transformação das instalações de modo a permitir o total cumprimento da Lei
110/2019 de 9 de Setembro, como por exemplo a presença de acompanhantes desde
a admissão da grávida até à respectiva alta;
– Adequação dos blocos de parto conforme o que já foi efectuado por exemplo no Centro
Hospitalar Médio Ave [Famalicão], disponibilizando desde bancos de parto; kits de
reanimação neonatal; camas sem perneiras; ferramentas úteis que visem o conforto da
parturiente – nomeadamente a utilização da massagem com recurso a bola de
massagem, óleos, bolas de pilates e amendoim, arco, rebozo, cordas de sustentação
fixadas no tecto, duche, calor localizado, espaço de deambulação livre, entre outros;
– Implementação da consulta do plano de parto, o que permite uma ponte de
comunicação com maior harmonia na sua análise e discussão;
– Implementação de colunas de som e wi-fi gratuito em todas as salas, para as utentes
levarem a sua música;
– Implementação de controle da luz do quarto e no bloco, favorecendo o relaxamento da
mulher grávida;
– Material em vídeo, e áudio para inclusão de pessoas com deficiência (doravante
PCD), e para utentes de língua estrangeira
– Estes conteúdos interactivos seriam uma mais-valia para o consentimento,
garantindo que todos os actos médicos seriam compreendidos facilmente,
auferindo controlo à utente sobre as suas escolhas e decisões informadas.
– Disponibilização durante 24 horas, analgesia farmacológica para alívio da dor,
nomeadamente, analgesia EV e loco-regional e a técnica de “walking epidural”onde é
possível, com analgesia instalada, a grávida manter-se em actividade, nomeadamente
caminhar e executar qualquer atividade física, mas também do óxido nitroso gerido pela
própria mulher, sob vigilância profissional.
– Formação específica dos profissionais de saúde que estão directamente
relacionados com obstetrícia, como por exemplo: técnicas de alívio de dor, fisiologia do
parto, comunicação empática, promoção do aleitamento materno, entre outras.
A própria evolução da sociedade e das expectativas da comunidade, mostram a demanda de
um acompanhamento com maior proximidade durante o processo de prestação de cuidados da
saúde sexual e reprodutiva, em especial no período da gravidez e do parto. Esta demanda
exige uma profunda transformação das infraestruturas, da actualização e fixação dos
profissionais, de estratégias de proximidade, de modo a permitir o cumprimento integral da
lei – como o mais apontado: a presença contínua de acompanhantes – ao mesmo tempo que se
torna numa melhoria, que causa um impacto positivo na prestação do serviço nacional de
saúde elevando os padrões de qualidade, indo ao encontro das necessidades actuais da
população, mas acima de tudo, do cumprimento cabal da lei em vigor.
Mantemos, mais uma vez, total disponibilidade para o diálogo com qualquer organismo público,
para que consigamos ter total transparência na realidade da saúde materna em Portugal,
dando prioridade máxima à autodeterminação da mulher, nunca violando a sua recusa ou
consentimento informados, preservando todos os direitos já consagrados pela legislação
portuguesa, à mulher e família que recorra aos serviços de saúde em todo o país.
Lisboa, 22 de Janeiro de 2023