Comunicado OVO PT | Mortalidade Infantil

13 de Maio 2025

 

COMUNICADO 

 

Agravamento da Mortalidade Infantil em Portugal: Um Alerta Urgente

 

O Observatório de Violência Obstétrica (OVO PT) manifesta profunda preocupação com o aumento da mortalidade infantil em Portugal, à luz dos dados mais recentes divulgados pela PORDATA e pelo Instituto Nacional de Estatística (INE). Em 2024, registaram-se 252 óbitos de bebés com menos de um ano, correspondendo a uma taxa de 3,0 por mil nados-vivos — o valor mais elevado desde 2019. Trata-se de um aumento de 20% em relação a 2023. E que 40% destes bebés faleceram na 1ª semana de vida, ou seja 100 bebés.

Este agravamento ocorre num contexto de crescente degradação do acesso a cuidados de saúde materno-infantis. O ano de 2024 foi marcado por sucessivos encerramentos de urgências de Ginecologia/Obstetrícia em diversos hospitais do Serviço Nacional de Saúde, especialmente na região de Lisboa e Vale do Tejo. Simultaneamente, milhares de grávidas continuam sem médico de família e sem acesso regular a cuidados de saúde primários, comprometendo o acompanhamento adequado da gravidez.

O OVO Portugal alerta ainda para a negação de acesso a cuidados de saúde a mulheres imigrantes, com relatos de recusas de atendimento, obstáculos administrativos e até impedimento físico de entrada em centros de saúde. Estas práticas são profundamente discriminatórias e violam o direito humano ao acesso à saúde.

O Observatório de Violência Obstétrica considera inaceitável que, em pleno século XXI, se mantenham barreiras tão significativas ao acesso aos cuidados de saúde sexual e reprodutiva, especialmente para mulheres em situação de maior vulnerabilidade social, económica ou legal.

O investimento público na saúde aumentou significativamente ao longo do período:

  • 2024: €15,7 mil milhões, representando um aumento de 9,8% face ao orçamento inicial de 2023 .
     
  • 2025: €16,85 mil milhões, um crescimento de 9% em relação à execução estimada para 2024 .
     

A distribuição orçamental para 2025 inclui:

  • Despesas com pessoal: €7,09 mil milhões (41,8% do total).
  • Aquisição de bens e serviços: €8,35 mil milhões (49,6%), abrangendo medicamentos, meios complementares de diagnóstico e terapêutica, e parcerias público-privadas .
     

O recurso a médicos tarefeiros (prestadores de serviços) tem sido uma prática comum para suprir a falta de profissionais no SNS:

  • 2023: O SNS pagou cerca de €203 milhões em prestações de serviço, um aumento de 19,4% face aos €170 milhões gastos em 2022.
  • Os médicos tarefeiros realizaram quase 5 milhões de horas em 2023, com um custo associado de €189,1 milhões.
  • Em 2024, o Serviço Nacional de Saúde (SNS) de Portugal gastou aproximadamente 213,3 milhões de euros na contratação de médicos tarefeiros, representando um aumento de 11,2% em relação a 2023 .
  • Além disso, foram gastos 10,38 milhões de euros com enfermeiros e 7,27 milhões de euros com outros profissionais de saúde, totalizando cerca de 230,97 milhões de euros em prestações de serviço 

Este aumento na despesa reflete os desafios enfrentados pelo SNS, incluindo a escassez de profissionais e a necessidade de garantir o funcionamento contínuo dos serviços de saúde.

Face a este cenário, o OVO PT exige:

  • Investimento urgente e sustentado na saúde materno-infantil, incluindo a reabertura e o funcionamento pleno das urgências de obstetrícia;
  • Atribuição de médico de família e vigilância adequada a todas as grávidas, independentemente do seu estatuto migratório;
  • Cumprimento rigoroso da Portaria 310/2016, com a publicação dos relatórios semestrais exigidos;
  • Recolha e publicação de dados desagregados sobre os bebés que faleceram, incluindo vigilância da gravidez, nacionalidade e condição legal das mães;
  • Garantia do acesso universal, equitativo e não discriminatório aos cuidados de saúde;
  • Políticas eficazes para a erradicação da violência obstétrica e para a promoção de práticas respeitosas de parto.

 

A mortalidade infantil é um dos indicadores mais sensíveis do estado de saúde de um país. Cada morte evitável representa uma falha colectiva e exige uma resposta pública firme e imediata.

OVO PT tem vindo a sublinhar, a morte como indicador único, é insuficiente. São necessários mais elementos de análise, para que se torne possível o melhoramento urgente do acompanhamento da gravidez,  parto e pós-parto, que tem decaído ferozmente,  sendo sempre imputadas culpas e responsabilidades à mulher, e nunca as falhas no acompanhamento. 

Urge a responsabilização do sistema, a clarificação das suas falhas, com o objectivo único de melhorar o atendimento aos utentes e famílias. 

É urgente a recolha de mais dados que nos permitam compreender a fundo estes fenómenos. 

A falta de dados leva o OVO PT a questionar se este aumento da morte materna e infantil se prende unicamente com a falta de assistência, ou se também está relacionada com um excesso de intervenção sem justificação clínica, onde a família é exposta a riscos por questões de conveniência e protocolos.

A falta de dados claros e sérios retira das mulheres e famílias uma importante ferramenta para a tomada de decisões conscientes e informadas, ao mesmo tempo que conduz a uma manipulação da opinião das massas sobre dados frágeis e pouco sérios.

Baseadas nesta opacidade e falta de transparência, deputadas da Comissão de Saúde da AD afirmaram em reunião com o OVO PT que a manifestação de sucesso das medidas implementadas pelo governo,  era visível pela significativa baixa de afluência às urgências.  É palpável agora, à luz destes dados, que a menor afluência às urgências é reflexo de uma política obstrutiva no acesso à saúde - por via da linha e por via da falta de contratação de equipas, que conduz ao encerramento de serviços. 

É de destacar também, a discrepância entre os dados de várias fontes: INE, SICO, PorData, as rectificações que se perdem na pesquisa, pouca clareza da origem dessas rectificações,  gerando confusão e menos transparência dos dados públicos nesta área.

O OVO PT mais uma vez, vem reiterar a necessidade de que os Grupos de Trabalho/Comissões tenham especialistas de várias áreas e sejam multidisciplinares, incluindo Observadores como por exemplo Associações que representam as Mulheres.

Mantemos, mais uma vez, total disponibilidade para o diálogo com qualquer organismo público, para que consigamos ter total transparência na realidade da saúde materna em Portugal, dando prioridade máxima à autodeterminação da mulher, nunca violando a sua recusa ou consentimento informados, preservando todos os direitos já consagrados pela legislação portuguesa, à mulher e família que recorra aos serviços de saúde em todo o país.

Lisboa,13 de Maio de 2025