O Observatório de Violência Obstétrica expressa a sua profunda preocupação em relação ao fecho rotativo das maternidades em Lisboa e Vale do Tejo, determinado pela operação “Nascer em Segurança” (1) do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Acreditamos que a actual reorganização está a ter um impacto negativo considerável nas utentes grávidas, nos indicadores da assistência materno-infantil, na ansiedade das gestantes e no desmembramento das equipas de assistência médica.
A operação “Nascer em Segurança” pretende que as gestantes tenham acesso a cuidados de saúde durante o período de fecho rotativo das maternidades, e surgiu como uma medida transitória, para fazer face ao problema do Natal e Ano Novo de 2022. Contudo, esta operação tornou-se sistema, normalizando encerramentos de maternidades, mesmo fora de períodos de férias.
Esta medida condiciona a interrupção do acesso regular a serviços de saúde materno-infantis, pela descontinuidade da relação médico-paciente, pelo retirar do direito da Mulher de escolher o local de parto conforme está explanado no Despacho 7495/2006 (2s), de 4 de Abril (2) – A consagração do direito de toda a mulher escolher livremente o local onde deseja ter os seus filhos em condições de melhor qualidade para a mãe e a criança – e indirectamente as instituições privadas vão engrossando os seus ganhos à custa desta instabilidade que o executivo do SNS teima em implementar, não escutando os profissionais de saúde envolvidos e acima de tudo as Utentes. Entende o OVO PT que a desistência do investimento no SNS se trata de estratégia política, e não observa nenhum indicador que aponte para acções de resolução do grave problema que atinge os serviços de urgência no SNS, onde paralelamente se observa um crescimento expressivo de lucro no sistema privado, financiado pelo Estado Português.
O fecho rotativo das maternidades leva a uma sobrecarga adicional nas maternidades que permanecem abertas, resultando em condições menos favoráveis para as utentes grávidas, ao mesmo tempo que assistimos à precarização das condições de trabalho de todos os profissionais de saúde. Além disso, a ansiedade das gestantes pode ser exacerbada devido à incerteza e à falta de informação clara sobre onde e quando procurar assistência médica, que deve ser encarado como perda da universalidade da saúde em Portugal, impactando negativamente na saúde pública.
O desmembramento das equipas de assistência médica também suscita preocupações sérias, pois leva a uma desconexão no acompanhamento e à falta de continuidade do cuidado. Isso é especialmente prejudicial durante a gravidez e o parto, momentos críticos em que a confiança e a relação estabelecida com a equipa de assistência médica são fundamentais. E vimos isto ocorrer no Hospital de Santa Maria.
Teremos quatro hospitais da Área Metropolitana de Lisboa a fechar mais vezes do que nos meses de Verão, o que implica sobrecarga para os restantes que estão abertos e possivelmente mais transferências para o privado. São eles:
CH Barreiro-Montijo
Junho-Setembro | Outubro-Janeiro 2024 | Partos Junho-Agosto * |
8 a 10 dias | 12 a 15 dias | 120/129/130 |
CH Setúbal, Hospital São Bernardo
Junho-Setembro | Outubro-Janeiro 2024 | Partos Junho-Agosto * |
6 a 8 dias | 12 a 15 dias | 119/123/116 |
Hospital Garcia de Orta (Almada)
Junho-Setembro | Outubro-Janeiro 2024 | Partos Junho-Agosto * |
6 a 8 dias | 8 a 10 dias | 196/224/225 |
Hospital Prof. Dr. Fernando Fonseca (Amadora)
Junho-Setembro | Outubro-Janeiro 2024 | Partos Junho-Agosto * |
4 dias | 6 dias | 241/254/236 |
* Portal da Transparência Partos e Cesarianas do SNS
Portugal evidencia-se no panorama internacional pelas conquistas alcançadas em alguns indicadores de saúde ao longo dos últimos 40 anos, nomeadamente uma das mais baixas taxas de mortalidade perinatal do mundo. Tal realidade apenas foi possível graças à existência de um Serviço Nacional de Saúde que privilegiou, desde sempre, a segurança dos cuidados prestados às grávidas e crianças face ao número de locais onde, no passado, era aceitável a realização de partos.
O Observatório de Violência Obstétrica exorta a união dos profissionais de saúde, das Utentes, das ademais Associações que lutam pelos Direitos das Mulheres e da Sociedade Civil, pela defesa da transparência e do livre acesso a serviços públicos da qualidade, com um investimento claro e transparente no SNS.
1 – https://www.sns.gov.pt/urgencia-obstetrica-ginecologica-e-bloco-de-partos/
2 – https://diariodarepublica.pt/dr/detalhe/despacho/7495-2006-958060
Lisboa, 2 de Outubro de 2023